Publicado em: 27 jan 2017

Entenda por que a segunda infecção da dengue dói mais

Entenda por que a segunda infecção da dengue dói mais

Cada vez mais comum, a segunda ou a terceira infecção pelo vírus da dengue aumenta as chances de a doença surgir de forma agravada. Especialistas sempre desconfiaram que uma falha no sistema imune do paciente poderia ser a responsável pelo fenômeno, mas nunca conseguiram desvendar a fundo os fatores envolvidos nele. Em um estudo publicado na edição desta semana da revista Science, pesquisadores mostram que um anticorpo produzido em excesso durante a nova infecção pode desencadear o problema. A molécula facilitaria a entrada e o avanço do vírus no corpo humano. Para especialista, a descoberta tem potencial para ajudar na criação de vacinas mais eficientes.

Quando uma substância nociva invade o corpo, o sistema de defesa produz anticorpos para lutar contra ela. Na segunda vez que isso ocorre, a ação se repete mais rápido, mas, no caso de algumas doenças, como a dengue, as células de defesa podem falhar durante a segunda ativação para neutralizar a ameaça. Esse fenômeno, chamado reforço dependente de anticorpos, foi o ponto de partida de pesquisadores norte-americanos e tailandeses.

“Meu laboratório estuda os mecanismos pelos quais os anticorpos agem in vivo. Nossos estudos atuais se concentram em determinar como as mudanças nesse componente complexo podem contribuir para as respostas da vacina e da infecção”, explica Jeffrey Ravetch, um dos autores do estudo e pesquisador da Universidade de Rockefeller, nos Estados Unidos. O trabalho também contou com a participação de investigadores da Universidade de Bangkok, na Tailândia.

Em laboratório, os pesquisadores analisaram anticorpos de pessoas hospitalizadas por terem contraído a doença pela primeira vez e de internadas enfrentando a segunda infecção. Os investigadores descobriram que os integrantes do segundo grupo tinham quantidade abundante de um anticorpo específico, diferentemente dos estreantes no tratamento contra a dengue.

Para os cientistas, o anticorpo encontrado em excesso pode ser o responsável por falhas no sistema de defesa, o que facilitaria a entrada e o avanço da doença. Eles ainda não sabem explicar por que essa falha ocorre, mas acreditam que mais investigações podem desvendar o fenômeno. “A assinatura de anticorpo que descrevemos tem uma alteração específica em uma única molécula de açúcar. Essa alteração permite que ela se acople a um receptor do vírus chamado FcRIIIA com maior afinidade. Atualmente, não entendemos completamente o mecanismo ligado a essa relação nem como a exposição à dengue influencia essa reação. Essa é uma área que vamos continuar explorando em meu laboratório”, diz Ravetch. Papel-chave

Celso Gramato, infectologista e patologista clínico da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML), explica que o fenômeno observado é uma das grandes questões abordadas em pesquisas sobre a enfermidade tropical. “Quando você tem dengue pela primeira vez, há 0,3% de chance de ocorrer uma forma grave da doença. Na segunda e na terceira vez, esse risco sobe para 3%. Algumas investigações que tentavam mostrar por que isso acontece foram feitas, mas nenhuma delas satisfatória”, diz.

O especialista, que não participou do estudo, também acredita que o anticorpo identificado possa ser o responsável por esse agravamento. “Nós produzimos diferentes anticorpos porque a natureza sabe que, se todos produzíssemos o mesmo tipo, as chances de aparecer um vírus que fosse resistente a ele seriam grandes e, assim, epidemias fatais aconteceriam. O que esse estudo mostra é que esse anticorpo, produzido por algum motivo apenas em quem já teve contato com o vírus, funciona como um cavalo de troia. Ele se gruda no vírus, mas não o mata. E quando o sistema imune vê o anticorpo ligado ao vírus, acha que o micro-organismo está morto e não o ataca, ou seja, essa célula facilita a entrada da dengue no sistema”, detalha Gramato.

Redação com SBPC/ML




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