Publicado em: 11 set 2015

‘Criminalizar o uso da maconha é inconstitucional’, dizem ministros

O retorno do julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a descriminalização das drogas, nesta quinta-feira (10), foi marcado por votos favoráveis à descriminalização da maconha e falta de consenso em relação a outros entorpecentes.

Responsáveis pelos três únicos pareceres sobre o tema até o momento, os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso votaram todos favoravelmente ao fim da punição criminal a usuários de maconha – e reforçaram a necessidade de se criar critérios para diferenciar consumidores de traficantes.

“Criminalizar o uso da maconha é inconstitucional, pois viola o princípio de individualidade de cada pessoa. Intimidade e vida privada são direitos fundamentais. É uma esfera imune à interferência de terceiros”, afirmou Barroso. “A vida privada é o espaço que vai da religião aos hábitos pessoais, ninguém tem nada com isso.”

Enquanto Fachin pediu ao Congresso que delimite uma quantidade para fazer as diferenciações entre usuários e traficantes, Barroso foi mais incisivo ao lembrar da urgência de se tornar objetivo o tema – até para policiais e juízes terem um embasamento para suas ações até os parlamentares decidirem abordá-lo.

Barroso citou estudos e leis internacionais para propor quanto cada pessoa poderia portar para não ser criminalizada. “Acho razoável que, assim como em Portugal, a pessoa possa ter 25 gramas de maconha ou seis pés de maconha fêmea em casa”, disse ele. “O STF deveria propor esses critérios para serem colocados em prática, mesmo que provisoriamente, até o Congresso legislar, o que até hoje não foi feito.”

Gilmar Mendes foi além, pedindo a descriminalização de todas as drogas, mas seus colegas argumentaram que o julgamento se concentre somente na maconha. “Isso envolve muito sangue e muita lágrima das pessoas. Então o usuário de cocaína continuará criminalizado e o de crack também? Essa é uma tragédia perfeita ao País”, criticou o ministro.

Inconstitucionalidade
Antes dos votos de Fachin e Barroso, o relator do processo, Gilmar Mendes, já havia, no mês passado, declarado inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei Antidrogas (Lei 11.343), sancionada pela Presidência da República em agosto de 2006.

O texto estabelece as penas para usuários baseadas na interpretação do juiz sobre a natureza da substância apreendida, o local onde ocorreu a apreensão, as circunstâncias sociais e pessoais do flagrado, bem como sua conduta no momento da abordagem. Para os ministros, isso acaba gerando prisões mais baseadas na situação financeira e na cor da pele do usuário do que naquilo que ele realmente fez. 

“O custo imenso que a sociedade brasileira teve com o criminalização, em termos de recursos drenados para a repressão, para o sistema penitenciário, na vida dos jovens que são destruídas no cárcere e o poder do tráfico sobre as comunidades e os resultados pífios, é imenso”, declarou Barroso.

“A criminalização não diminuiu o consumo. O consumo continuou como era e as estatísticas demonstram que a descriminalização não produz impacto relevante sobre o consumo. Portanto, estamos gastando esse dinheiro todo, prendendo essas pessoas, para manter os níveis de consumo no mesmo patamar que ficaria se não fizéssemos nada disso. Não há lógica que sustente essa política pública.”

Usuários de crack em São Paulo: drogas pesadas estão praticamente excluídas do debate
Reprodução/Facebook

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A origem do processo que começou a ser analisado pelo Plenário do STF é o recurso da defesa de Francisco Benedito de Souza. Em 2009, ele assumiu ser dono de 3 gramas de maconha encontradas durante inspeção no Centro de Detenção Provisória de Diadema, Região Metropolitana de São Paulo. Souza, que cumpria pena no local, acabou sendo enquadrado no artigo 28 da Lei Antidrogas. 

O relator do recurso extraordinário já havia aberto a votação com parecer favorável à descriminalização do porte de drogas. “Estou então, nesta linha, declarando a inconstitucionalidade sem redução de texto do artigo 28 da Lei 11.343 de forma a afastar do referido respectivo todo e qualquer efeito de natureza penal. Restam mantidas as medidas ali previstas com natureza civil administrativa”, disse Mendes em seu voto.

Presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski pediu vista do processo e o suspendeu para melhor avaliá-lo, no final da tarde desta quinta-feira.

Com IG



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