‘Brutalidade do caso Daniel mascarou crime contra mulheres’, diz advogada
O assassinato do ex-jogador do São Paulo, Daniel, que aconteceu último dia 28 em São José dos Pinhais, no Paraná, chamou a atenção da advogada penal e professora de Direito da Universidade de Mogi das Cruzes, Marcelle Tasoko. “A barbaridade e os sinais de tortura que envolvem o caso anularam crimes contra mulheres. Cristiana Brittes foi exposta pelo jogador em um grupo de WhatsApp e, segundo uma testemunha, foi agredida pelo marido”.
Segundo as investigações, Daniel, de 24 anos, participava de um grupo de WhatsApp em que compartilhava fotos e vídeos de mulheres com quem havia feito sexo. A informação apareceu nos boletins policiais, segundo Marcelle, de forma superficial — isso porque a violência com a qual ele foi assassinado chama muita atenção. Mas é importante dizer: publicar ou enviar fotos e vídeos de nudez e sexo sem o consentimento de quem protagoniza as imagens é crime e a pena varia de um a cinco anos de prisão. “Ele enviou fotos ao lado de Cristiana, que parecia desacordada, e disse que havia transado com ela”, relembra.
Além disso, segundo uma testemunha, Edison Brittes Júnior teria agredido a mulher antes de espancar o jogador. “São muitos crimes contra mulheres em torno do caso: há a suspeita de que Cristiana estaria desacordada quando foi fotografada. Mesmo se não houver penetração, qualquer ato libidinoso cometido contra alguém desacordado é considerado estupro de vulnerável”, explica Marcelle. “Depois, ele divulgou as fotos dos dois na cama e disse que havia transado com ela. Quando o marido os viu juntos, deu tapas nela. Tudo isso ficou em segundo plano”.
Foi em setembro deste ano que a exposição pornográfica não consentida se tornou crime. Segundo Marcelle, antes, o ato era julgado como injúria e difamação. “É um avanço, já que os danos causados a mulheres expostas intimamente na internet são grandes”.
A psicóloga cognitiva e comportamental Livia Marques considera a exposição virtual uma violência que pode causar danos físicos e psicológicos. “Por causa do trauma e dos julgamentos das pessoas, a vítima pode ter ansiedade e crises de pânico. Os principais sintomas são palpitação, tremores pelo corpo, alteração de apetite, de humor e de sono”, explica.
Segundo a psicóloga, vítimas de exposição na internet podem, inclusive, desenvolver depressão, problemas de autoestima e agressividade. “Há uma vontade grande de se isolar por medo das chacotas”.
O que fazer
A sugestão de Livia é que que vítimas de exposição pornográfica procurem pessoas acolhedoras. “A dor é amenizada quando a pessoa se entende como uma vítima e é tratada de tal forma por amigos e familiares”.
Já a advogada recomenda que o boletim de ocorrência seja feito em delegacias da mulher. “Qualquer um pode prestar queixa, desde a vítima até alguém que recebeu as imagens. Basta levar uma foto da tela do celular, um print screen. Se o suspeito tiver vínculo com a vítima, a pena pode aumentar de um a dois terços”.
Foi o que aconteceu com Marília*, que denunciou o ex-namorado por ter enviado fotos íntimas dela a amigos do casal. “Terminei um relacionamento de seis anos e fui vítima de pornografia de vingança. Descobri porque ele enviou as imagens para amigos em comum, e um deles veio me contar. Fui até a polícia e prestei queixa. Ele foi chamado, teve que prestar depoimento e ficou preso por cinco dias”, conta.
A advogada explica que a tipificação do crime é subjetiva. “Muitos caras dizem que a mulher autorizou previamente e não tem como provar. Depende do delegado. Infelizmente, nossa sociedade estruturalmente machista pouco protege as mulheres”.
*O nome utilizado nesta reportagem é fictício e visa preservar a identidade da personagem
Universa
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