O TecMundo recebeu a informação de que crianças e adolescentes estão sendo coagidas a participar do jogo “Baleia Azul” no Facebook. No caso, cibercriminosos brasileiros com provável acesso ao banco de dados do Serasa e Cadastro Nacional assustam as vítimas menores de idade na rede social ao mostrar dados pessoais e fazer ameaças.

O cibercriminoso confronta uma criança com dados pessoais como nome completo e escola em que estuda

Iniciado na Rússia entre 2015 e 2016, o “jogo da Baleia Azul” (Blue Whale) está supostamente ligado a uma série de suicídios em todo o mundo. Isso porque ele busca causar danos emocionais aos participantes. No caso, as vítimas são coagidas a seguir instruções feitas por “curador”, como é chamado o criminoso que entrega os desafios. De acordo com relatos, o jogo dura cerca de 50 dias com desafios que vão desde “assistir a filmes de terror durante madrugada”, “rasgar a própria a pele com a faca até X hora do dia”, chegando até o desafio final, que seria o suicídio.

Normalmente, os alvos dos criminosos são crianças e adolescentes, já que são facilmente impressionáveis. No Brasil, como você poderá ver nas imagens obtidas pelo TecMundo, o cibercriminoso confronta uma criança com dados pessoais como nome completo, escola em que estuda, média de notas escolares, cidade, endereço, IP e nome de amigos próximos.

“Primeira tarefa: desenhe uma baleia com estilete no braço, depois tire uma foto quando estiver sangrando e me envie. Você, seus amigos e sua família correm perigo, espero que você salve a eles. Dez minutos para a conclusão, fico no aguardo. Contagem começando”, enviou a mensagem o cibercriminoso. O perfil de quem enviou a mensagem se apresenta como Victor Moreira e diz que trabalha na “empresa” Baleia Azul Jogo.

Screenshots mostrando coação

Não é brincadeira

Para você, o jogo da Baleia Azul pode não passar de uma brincadeira de mau gosto. Acontece que esses cibercriminosos estão entrando em grupos de autoajuda, superação da depressão, discussão sobre transtorno de ansiedade generalizada (TAG) e aconselhamento pró-vida no Facebook para encontrar vítimas.

Na Rússia, país onde o Blue Whale surgiu, um noticiário local chamado Novaya Gazeta informou que a morte de 130 crianças e adolescentes estaria ligada com esse jogo. Por lá, não é o Facebook que reina, então o Baleia Azul acontecia em uma rede social chamada VK. Porém, apesar de o jornal realizar essa ligação entre mortes e desafios, as autoridades locais ainda não fizeram declarações oficiais sobre o assunto.

O Jogo ‘Baleia Azul’ é apenas mais um esquema criado por pessoas mal-intencionadas para seu próprio lucro, interesse e divertimento

O TecMundo conversou com o sociólogo André Sobral para entender mais sobre o motivo de as vítimas acabarem atraídas pelos desafios. “A vida é uma experiência que pode ser muito conturbada e desafiadora. Mesmo as pessoas categorizadas pelos jornais como jovens de ‘família estável’ e ‘vida material confortável’ podem estar passando por experiências emocionais difíceis. Como animais sociais, nós dependemos de um ambiente acolhedor e afetuoso. Nós necessitamos de aprovação e validação em nossas ações, seja das pessoas que amamos ou dos grupos em que convivemos”, comentou.

“Pessoas fragilizadas por eventos traumáticos, isoladas emocionalmente, que possuem dificuldade em confiar ou que se sentem cobradas e exigidas em demasia são mais propensas a desenvolver quadros depressivos que as tornam alvos fáceis para esse tipo de manipulação. Quanto maior o sofrimento vivido pelo indivíduo, mais sedutora é a proposta de se sentir vivo através de desafios, a provocação da ideia da morte como um jogo. A criação de grupos de suicidas na internet é um fenômeno registrado desde o ano 2000. O Jogo ‘Baleia Azul’ é apenas mais um esquema criado por pessoas mal-intencionadas para seu próprio lucro, interesse e divertimento”, nota André Sobral.

O sociólogo deixa claro que o jogo Baleia Azul ataca “os mais vulneráveis, utilizando-se da inocência, da paranoia e da neurose de suas vítimas para fazê-las acreditar que estão à mercê dos administradores, ou seja, utilizam-se de engenharia social, ameaças genéricas e dados publicamente disponíveis na rede dos usuários para criar uma ilusão de poder e controle”.

Perfil de Victor Moreira, autor das ameaças mostradas na imagem acima

Sim, é crime

De acordo com o advogado criminalista Paulo Crosara, a conduta dos mentores do Baleia Azul é criminosa. “Induzir (criar a ideia de suicídio em alguém), instigar (incentivar alguém que já estava pensando em suicídio) ou auxiliar (ajudar materialmente o suicida) o suicídio de outra pessoa é crime, de acordo com o art. 122 do Código Penal, punido com pena de 02 a 06 anos de prisão caso o suicídio se consuma ou de 01 a 03 anos de prisão caso a tentativa de suicídio resulte em lesão corporal grave. É um delito grave, sendo um dos cinco crimes no Brasil que são levados à júri popular”.

Tanto maior quanto menor de idade poderá ser enquadrado

O advogado alerta que, caso você seja ou conheça alguém nessa situação, é preciso procurar imediatamente as autoridades competentes. “Você poderá lavrar um Boletim de Ocorrência em uma delegacia (em algumas cidades maiores, há delegacias especializadas em crimes cibernéticos) e/ou procurar o Ministério Público de sua comarca. Caso você tenha acesso às conversas trocadas entre o mentor e o jogador, pode comparecer a um cartório de notas, onde será lavrada uma ata notarial, dando fé pública ao conteúdo das mensagens (essa ata será importante fonte de prova caso as mensagens sejam apagadas)”.

Obviamente, não é possível afirmar que os cibercriminosos por trás do Baleia Azul são maiores de idade. Por isso, o advogado também nota que, caso eles sejam menores, “as condutas criminosas que praticarem entram como ato infracional, estando sujeitos às penalidades instituídas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. A indenização cível deverá ser paga pelos seus responsáveis legais”.

Como combater o Baleia Azul

Se você está sofrendo algum tipo de assédio para participar desse ou de outros jogos na internet, e o criminoso fornece seus próprios dados como confronto, você precisa saber algumas coisas. Como nota André Sobral, “os criadores do jogo não possuem qualquer poder sobre sua família, seus amigos ou sua vida; eles dependem de sua cooperação para qualquer efeito que desejam criar”.

É importante estarmos próximos de nossos filhos, amigos e parentes

Dessa maneira, você precisa denunciar perfis e comunidades que propagam jogos que lesam a estabilidade emocional e buscam fragilizar outras pessoas. Para os pais, Sobral diz que “é importante estarmos próximos de nossos filhos, amigos e parentes não apenas fisicamente, mas sermos cúmplices deles em suas vidas, compreendermos seus dilemas, sofrimentos e apoiarmos de todas as formas suas batalhas”.

O Facebook possui ferramentas de denúncia, e você sempre pode buscar órgãos apropriados como a SaferNet e autoridades locais: