Como o ‘não curtir’ pode tornar o Facebook mais ‘viciante’ e ‘lucrativo’
“Devo ou não curtir este post?” Quem usa o Facebook provavelmente já se perguntou o que fazer diante de uma publicação sobre um tema triste ou delicado.
O botão de um dedão apontado para cima é um dos recursos mais populares na rede social.
Não parece, no entanto, ser muito apropriado “curtir” uma mensagem sobre o falecimento de uma pessoa, mesmo que se tenha apreciado o texto em sua homenagem. Ou a notícia de uma tragédia, ainda que a solidariedade em torno do acontecimento seja louvável.
O Facebook está tentando resolver esse dilema. Mark Zuckerberg, seu criador e presidente, disse na última terça-feira que estuda uma alternativa ao “curtir”.
“As pessoas pedem isso há muito tempo. O que elas querem é uma forma de demonstrar empatia. Nem todo momento é um momento feliz”, disse Zuckerberg, citando a crise de refugiados sírios como exemplo.
Por enquanto, o Facebook revelou poucos detalhes deste novo recurso. Zuckerberg apenas explicou que será testado com uma parcela do público.
Não se sabe ainda como será chamado – o nome que está sendo usado por enquanto nas discussões sobre este novo mecanismo é o de “não curtir” -, se será um botão, qual será seu símbolo. Se valerá para todos os posts ou só para aqueles de temas mais delicados.
Com o “não curtir”, Zuckerberg também poderá tornar a rede social mais popular e lucrativa, avaliam especialistas ouvidos pela BBC Brasil.
Mas eles alertam para o risco da novidade acirrar ainda mais os ânimos dos debates e discussões na internet.
Fórmula secreta
O “não curtir” significa uma mudança na alma do Facebook: seu algoritmo.
O site tem parâmetros e regras para avaliar o conteúdo publicado e definir o que será exibido para cada usuário.
Cliques, publicações, curtidas, comentários e compartilhamentos. Tudo que fazemos vira um dado que alimenta esta fórmula secreta.
O site conhece assim as preferências de cada membro e filtra as publicações para exibir o que tem mais chances de agradar ou gerar interesse.
O “curtir” tem um peso importante nesta equação desde que foi lançado, em 2009. Um post com muitas curtidas tem mais chances de aparecer também para mais usuários e movimentar ainda mais o Facebook.
Mas, enquanto mensurar a reação positiva a uma publicação é relativamente simples, refletir um sentimento como a empatia é um pouco mais complexo.
Lacuna
O “não curtir” chega para preencher esta lacuna, dando ao algoritmo do Facebook um novo tipo de informação.
“O usuário pode não querer curtir um conteúdo triste, mas às vezes faz isso para dizer ‘obrigado por ter compartilhado’ ou ‘sinto muito'”, afirma Fábio Malini, professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e coordenador do Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic).
“O ‘não curtir’ ajudará a identificar esse tipo de conteúdo, que não recebe muitas curtidas hoje, mas ainda assim é relevante. O alcance dele tende a ser maior.”
Conhecer melhor seu público também pode aumentar a popularidade do Facebook, avalia Marcelo Tripoli, vice-presidente de criação e planejamento para América Latina da agência de mídia digital SapientNitro.
“Ao mostrar cada vez mais o que de fato interessa a alguém, o site se tornará mais viciante”, diz.
E lucrativo. O Facebook faturou no ano passado US$ 12,47 bilhões (R$ 48 bilhões), quase integralmente a partir de anúncios.
Para que eles façam sucesso, a rede social os direciona segundo o que aprendeu sobre cada usuário e a intenção do anunciante.
O “não curtir” ajudará a fazer isso de forma mais eficiente.
“Eles pretendem tornar a sociedade melhor? Não, é para vender mais anúncios. Ao entender melhor o comportamento de um usuário, a publicidade tem mais chances de ter sucesso”, diz Malini.
Fábio Marques, gerente de marketing da Scup by Sprinklr, agência de monitoramento de redes sociais para marcas como Tam, Bradesco, Philips e Peugeot, acredita que o novo recurso pode ser útil para empresas.
“Será interessante para medir com mais precisão a opinião do consumidor”, diz Marques.
“Hoje, se algo não ganha muitas curtidas, parece que ele desagradou, mas não sabemos ao certo. O ‘não curtir’ indicará, por exemplo, se as pessoas realmente não gostaram de uma campanha ou um produto.”
Empatia ou ódio?
Apesar destas vantagens e dos pedidos pela nova função, o Facebook sempre foi cauteloso.
Até o ano passado, Zuckerberg não dava esperanças de que ela viraria realidade.
“As pessoas pedem por isso porque querem dizer ‘isso não é bom’. Não achamos que isso é legal para o mundo. Não vamos criar algo assim”, disse em dezembro, em uma sessão de perguntas como a de terça-feira.
Desta vez, ele voltou a reforçar que o objetivo não é criar uma forma de espalhar ódio pelo site.
“Não faria sentido para o negócio da empresa criar um clima de negatividade”, diz Marques, da Scup.
“No Facebook, colocamos opiniões e posts que nos representam. Imagine publicar um texto e receber 40 ‘não curti’. Isso desestimularia as pessoas de usarem o site.”
Mas a intenção do Facebook ao lançar esta novidade pode não se traduzir na forma como será usada na prática, diz Malini, do Labic.
“As pessoas costumam ter opiniões mais radicais em redes sociais. Acho difícil o ‘não curtir’ não ser adotado por quem costuma espalhar o ódio nelas”.
“Vai ter quem dê um ‘não curti’ para todo post da Dilma ou do Aécio. As pessoas poderão fazer campanhas contra um tema do qual discorda, como já ocorre em outros sites”, afirma Malini.
“Faz mais sentido ser aplicado somente em certos casos, porque senão pode colocar gasolina na fogueira”, afirma Tripoli da SapientNitro.
“Estudos já mostraram que receber uma curtida gera uma descarga de dopamina e gera prazer. Pense como seria o contrário. Se pudermos dar um ‘não curti’ para tudo, acho que muitas amizades serão desfeitas.”
Com G1
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